Os consumidores que compraram pacotes da empresa 123Milhas enfrentam dificuldades para receber os serviços contratados ou o ressarcimento dos valores pagos. A empresa tem disponibilizado voucher para os clientes. Mas com o pedido de recuperação judicial, nesta terça-feira (29), aumentaram as incertezas sobre esse ressarcimento, uma vez que o processo permite que companhias suspendam e renegociem parte das dívidas acumuladas em um período de crise, segundo o Instituto de Defesa do Consumidor (Idec).
“O pagamento aos credores é adiado ou suspenso por tempo determinado, permitindo que a empresa foque no pagamento de funcionários, tributos e matéria-prima essenciais para o funcionamento do negócio”, explica o instituto.
Ao anunciar o pedido de recuperação judicial, a 123Milhas argumentou que a medida tem como objetivo “assegurar o cumprimento dos compromissos assumidos com clientes, ex-colaboradores e fornecedores” e que “permitirá concentrar em um só juízo todos os valores devidos”.
A empresa acredita que, dessa forma, chegará “mais rápido a soluções com todos os credores para, progressivamente, reequilibrar sua situação financeira”.
A recuperação judicial ainda precisa ser aprovada na Justiça.
A iniciativa, entretanto, fez alguns órgãos de defesa do consumidor adotarem medidas como a proibição da venda de novos pacotes de viagens. O Procon do Distrito Federal disse à Agência Brasil, que a partir desta quarta-feira (30), a 123Milhas está proibida de operar na capital federal, sendo impedida de vender novas passagens aéreas ou pacotes de viagens, promocionais ou não.
A decisão do Procon, que é cautelar, ocorre após o aumento expressivo de reclamações no Distrito Federal de consumidores com problemas com a 123Milhas. Desde a data da suspensão dos voos da linha promocional, no dia 18, até a segunda-feira (28), 142 consumidores já reclamaram no órgão em relação ao atendimento da empresa. O número representa quase a totalidade das queixas contra a 123Milhas no ano passado, e quase o dobro de reclamações em 2021.
A servidora pública Juliana Olivier, após fazer uma reclamação na plataforma consumidor.gov, também protocolará uma reclamação no Procon-DF. À Agência Brasil ela disse ter comprado quatro passagens de ida e volta de Brasília para João Pessoa, à vista, no valor de R$ 2.056 para uma viagem de férias da família. As passagens não foram emitidas e a empresa ofereceu três vouchers separados, em vez de um no valor integral da compra.
“Após a negativa de emissão das passagens, a empresa absurdamente me disponibilizou três vouchers separados, no valor de R$ 723,03 cada, ao invés de um só com o valor integral. Obviamente, não era possível utilizar os três vouchers para uma única compra, ou seja, eu perderia parte do valor dos vouchers e ainda teria que desembolsar mais dinheiro, para conseguir comprar todas as passagens que preciso”, reclamou a servidora.
“Abri uma reclamação no consumidor.gov e a empresa respondeu, alegando que resolveu meu problema com a disponibilização dos vouchers. Mas não adianta disponibilizar voucher que o cliente não consegue usar conforme suas necessidades. Vou falar com o Procon hoje”, disse.
O Código de Defesa do Consumidor (CDC) determina que o voucher não pode ser a única forma de reembolsar o valor e que cabe ao cliente o direito de escolher a forma de reembolso, que podem ser o cumprimento forçado da oferta; o reembolso de todo o valor já pago, inclusive com correção monetária, e o aceite de um produto ou serviço equivalente.
“Em muitos casos, o voucher pode valer a pena, mas se os valores de uma nova passagem ou pacote forem muito superiores ao da compra original ou simplesmente quiser comprar em outra empresa, saiba que você não é obrigado ou obrigada a aceitar o voucher”, explica o Idec.
O Idec ressalta que além de tentar resolver com a empresa, é importante o consumidor registrar reclamação na plataforma consumidor.gov e no Procon. Caso nenhuma das alternativas tenha efeito, o caminho será recorrer à Justiça.
“Se mesmo tentando a negociação amigável a empresa não resolver seu problema, a última medida é o ingresso na Justiça. Além disso, raramente as empresas indenizam o consumidor por danos em negociação amigável, então a abertura de processo judicial se mostra como uma medida eficaz caso você tenha sofrido danos adicionais com a perda das passagens ou viagem. Em especial nesse caso da 123Milhas”, disse o instituto. “Se o valor do pacote, somado com eventuais danos, for inferior a 20 salários mínimos, é possível entrar com processo no Juizado Especial Cível, gratuitamente e sem advogado”, recomenda.
O Procon-DF informou que notificou a 123Milhas, no dia 21 de agosto, para dar esclarecimentos sobre a suspensão dos pacotes turísticos e da emissão de passagens da linha promocional. O prazo para resposta foi estipulado em 48 horas. A 123 Milhas chegou a apresentar justificativa ao Procon dentro do prazo determinado, mas as explicações não foram satisfatórias, segundo o órgão de defesa do consumidor.
Com a recusa da justificativa apresentada pela empresa, o Procon abriu um processo administrativo interno, já em caráter punitivo, no dia 25. “A 123Milhas foi novamente notificada, agora em um procedimento investigatório, e tem prazo de 10 dias para apresentar defesa. Após esse prazo, e caso a defesa não seja aceita, o Procon aplicará multa à empresa, que, nesse caso, pode chegar a cerca de R$ 11 milhões”, disse o Procon.
Em nota, a 123Milhas disse que continua fornecendo dados, informações e esclarecimentos às autoridades competentes sempre que solicitados. “A empresa e seus gestores se disponibilizam, em linha com seus compromissos com a transparência e a ética, a construir conjuntamente medidas que possibilitem pagar seus débitos, recompor sua receita e, assim, continuar a contribuir com o setor turístico brasileiro”, diz a nota.
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